Anexo Três: Tratado das Paixões da Alma – Primeira Parte

“Se me obrigassem a dizer porque o amava, sinto que a minha única resposta seria: Porque era ele, porque era eu. “

Michel de Montaigne

Há quem diga que fui o melhor…que muito do que aconteceu foi da minha autoria. Há quem diga que fui uma ponte…que fui um elo de ligação entre Veteranos/Doutores e Caloiros. Há quem me considere a “alma” das praxes…dos momentos de diversão, alegres e bem-dispostos que se criaram. Há quem se refira a mim como o maior…como o que teve a coragem de dar o primeiro passo em muitos momentos. Há quem me considere o seu orgulho…o rapaz da iniciativa. Há quem me diga que fui um elemento essencial…inesquecível. Todavia, discordo de todos esses adjectivos que usam para me qualificar (apesar de os agradecer do fundo do coração).

Quando olho para trás, ou quando me auxilio em fotografias para fazer a minha memória lembrar-se dos pormenores já passados, não vejo o que em cima relatei. Quando olho para trás, vejo um grupo…uma partilha de sorrisos…uma esperança nos olhos dos que me rodeavam…”o riso e a voz refeita à luz do dia”. Quando olho para trás, vejo um grupo de pessoas que decidiu fazer da simplicidade dos dias num prolongar do tempo fechado no seu mistério. Quem não se lembra do “cantochão alentejano” que a Sara Mendes espalhou pelo nosso falar? O seu à-vontade e a sua capacidade de partilhar connosco “lugares e capítulos de uma vida inteira”, expostos nos enquantos dos seus magníficos sorrisos, trouxeram um certo sabor a Alentejo às praxes lisboetas…o seu poder de iniciar os momentos, juntamente com o seu excelente sentido de humor, principiaram-nos com pequenos instantes, pequenos fragmentos do tempo que só as nossas gargalhadas sabem contar com exactidão. Quem não se lembra do “Oriente no olhar” da Cátia Guerreiro? A sua beleza de “rosa de sal”, reflectida numa “doçura implacável” ou num sorriso onde “nada se apaga nem se esquece”, espantou todos os que a rodeavam…a sua força de carácter e o seu poder de iniciativa permitiram-nos registar muitos risos nas nossas tábuas da memória. Quem não se lembra da simplicidade e da amabilidade que caracteriza a Ludmila? Foi a sua forma de denunciar o que pensa, o “que sente a gente certa”, que nos fez vê-la como “a planta que não floriu e tem dentro de si, escondida, a luz das flores”…foi de forma modesta que derrubávamos as falas ditas em silêncio, construindo, com ela, conversas em que “mergulhávamos no anonimato e ocultávamos nele os nossos passos.” Quem não se lembra dos risos e gargalhadas da Cláudia Gentil, que seguravam “o tecto da alegria”? Os seus momentos orgasmicos, ou os seus pequenos passos em direcção à iniciativa, vão estar sempre presentes nos registos da memória de todos…onde quer que houvesse uma brincadeira por realizar, ou um momento vazio no tempo, lá aparecia ela, com a sua “coragem de correr contra a ternura”, e fazia-nos brilhar com os nossos sorrisos. Quem não se lembra do “verso em branco e sem medida” que foi o Hugo Ferreira (Noddy e/ou Justo, para os amigos)? Inicialmente, “fechado no seu mistério”, aos poucos e poucos, foi demonstrando a sua verdadeira maneira de ser…aos poucos e poucos, o ar sério foi caindo por terra, dando lugar aos seus risos, às suas brincadeiras, à sua capacidade única de fazer tocar a buzina do Noddy, a sua boa disposição, o seu à-vontade nas brincadeiras e “o riso e a voz refeita à luz do dia”, que denunciava, claramente, que ele era o melhor de nós. Quem não se lembra da maneira catita com que mergulhámos “no anonimato” da Mara e ocultámos “nele os nossos passos”? Em pequenas passagens “para o breve”, construímos conversas como se “fossem pequenos barcos que navegam” em torno destas ilhas de palavras feitas de tempo…assim, com uma personalidade afável, cuidadosa e, sempre, energética foi um elemento com quem podíamos contar em cada iniciativa que nos esperava…merecendo toda a minha admiração por estar sempre pronta a responder aos apelos de quem a rodeava. Quem não se lembra da “força de viver enraivecida” (unicamente, comparada com a beleza dos seus olhos) da Maria? A sua beleza “de flor de Lua”, os seus olhos de mar e os seus cabelos de Sol trouxeram, às praxes, o esplendor do Ribatejo…“espreitando no fim de um dia cansado” com os seus sorrisos e os seus risos, sabia como nos fazer continuar…a sua forma de entrar, energeticamente, em todas as brincadeiras, o seu entusiasmo (demonstrado nos longos passos dos dias) e o modo orgulhoso com que defendia o nosso grupo de caloiros nos frente-a-frente com os restantes grupos, tornaram-na num membro essencial para os nossos quinze dias incríveis. Quem não se lembra da alegria da Susana, que era como uma “janela debruçada sobre a vida”? Apareceu apenas no segundo dia, mas depressa se tornou no “despertar de um tempo adormecido”, trazendo a frescura do seu aroma aos exíguos passos que demos nesses grandes dias…a sua criatividade, o seu entusiasmo e o carinho com que se dedicava à interacção interpessoal demarcou-a dos restantes, demonstrando, brilhantemente, que até a brincar se pode ter qualidade (sem termos de ser considerados de infantis). Quem não se lembra da forma de como o Paulo falava em silêncio? Depois de derrubarmos “a barreira do eco de antigos sons murmurados”, descobrimos os pequenos apontamentos com que nos presenteou…devagarinho, vimo-lo desabrochar do lugar “onde o silêncio fez ninho” e largar gargalhadas…pequenos risos…entrando, deste modo, nas nossas brincadeiras. Quem não se lembra do “presente imerecido” que foi a Soraia? Ela foi uma “laranja amarga e doce”, com quem partilhei longas conversas nos curtos instantes do tempo, de forma a conseguir lembrar-me que “é por sermos todos iguais que nos esquecemos” de aproveitar a singularidade que cada um tem para oferecer…a humanidade, que lhe foi imposta ao nascer, ganhava vida a cada dia que passava, desenhando, no seu rosto, os sorrisos sinceros, que só ela sabe ter, e partilhando com todos os seus encantos. Quem não se lembra da Cláudia Leandro, que tinha “de mil desejos o esplendor”? O seu estar, inicialmente, tímido foi-se desenvolvendo, dando lugar a uma rapariga desinibida, carinhosa e divertida…dançou, cantou, disse palavras sem sentido e contagiou os que se encontravam à sua volta com uma personalidade incomparável, tudo em nome dos momentos de alegria (uns tímidos, outros mais descontraídos, mas com ela sempre a ser fiel a si mesma). Quem não se lembra da “lua de cristal” e dos “ramos rubros do Outono lento” da Inês? Sempre calada, a observar o que acontecia à sua volta, enquanto se deixava prender pelas pausas dos dias…até ao momento em que foi colocada no centro de uma praxe, que lhe retirou os arames que prendiam a sua “réstia de luz intensa, de voz aberta” para o mundo, e lhe fizeram sobressair a verdadeira essência do seu carácter: o lado divertido da criatividade. Quem não se lembra do entusiasmo contagiante da Selma? Ela trouxe dentro de si “flores de muitos países e solidões sonhadas”, que partilhou energeticamente com todos…com a sua humildade natural, soube cativar, quando tinha de socializar, soube ser divertida, quando tinha de brincar, soube ser criativa, quando chegava a altura de ser praxada, soube ser cativante, quando era abordada pelos demais, soube entusiasmar, quando as desgarradas começavam umas atrás das outras, soube defender, quando o nosso orgulho era posto em causa por canções repetidas até à exaustão, e soube ser ela mesma (com um pequeno toque de magia), quando os dias lhe pediam para o ser. Quem não se lembra do sotaque nortenho que o Hugo Cerqueira trouxe ao nosso dizer? Quando chegou ao nosso grupo (no segundo dia de praxes), claramente se notou que nele “existe a esperança acesa atrás do muro”…depressa se adaptou, depressa se integrou e depressa começou a distribuir brincadeiras, a espantar os demais com as suas passagens para o “breve instante da loucura”, a encantar com a sua personalidade amistosa, a saber cativar os que se encontravam à sua volta, a oferecer momentos feitos de grandes recordações…a demonstrar as razões pelas quais o considero o Caloiro do Ano/Melhor Caloiro. Quem não se lembra do quão ficou maravilhado com o “poema feito de gomos de saudade” que foi a Josie? A sua passagem foi breve, mas marcante…”secreta e pura”, ousada e alegre, caminho que nos leva para sítios e caminho que nos leva para casa, “espuma de muitas águas” e “o corpo enrugado da lenha”, o “pé do lume” e “a impalpável cinza”…tudo nela disse Brasil, tudo nela disse Portugal…numa “sina de quem nasce fraco ou forte, o riso, a raiva e a luta de quem cai ou que resiste”. Quem não se lembra da Cátia Pinheiro, que era dona de uns olhos de onde brotavam outros mundos? A última contratação de luxo para o nosso plantel é considerada (por mim) como a caloira prodígio, uma vez que conseguiu fugir, na maior parte das vezes, ao flash mortífero da máquina fotográfica da Liliana (as fotografias em que aparece podem-se contar pelos dedos de uma mão) …tal como nos seus olhos “a terra emergia pura do mar”, a sua personalidade e o seu encanto “eram lentas madrugadas” que devagarinho se foram soltando das paredes do mundo…assim, vimos “nascer uma flor” que procurava bons momentos, alegrias para ladrilhar com risos e vivências históricas de muitos instantes, ao mesmo tempo que encantou as pessoas que tiveram contacto com a sua grande alma, boa disposição, energia, criatividade e capacidade de socializar. Quem não se lembra da “topázio ou seta de cravos que propagam o fogo” que foi a Maria João Machado? No início, apresentava uma postura sisuda e fechada, mas, tal como “foge a paisagem na neblina”, a sua verdadeira essência foi-se revelando…nunca recuando no que era, o seu “espírito acendeu (…) um lume” “liberto das amarras da razão” e brincou e sorriu e riu e foi pastora e liderou e criou momentos inesquecíveis e, no fundo, deixou-se perder pelos caminhos das praxes…deixando que o brilho da sua contagiante personalidade tocasse em todos os que se encontravam com ela…fazendo de mim um fan desta pessoa que considero ser um chocolate amargo (os meus favoritos). Quem não se lembra da energia inesgotável da Sara Amaral? Trazendo dentro de si “um astro que flameja”, ela foi quem soube aproveitar melhor os momentos criados com o pretexto de praxar os caloiros…bastava observá-la para percebermos que todos os instantes passavam por ela como se fossem um “vento de bandeiras que” percorria a vida dela, deixando marcas em todos os pontos de paragem…bastava olha-la para ser denunciada a pessoa que era alegre, bem disposta, divertida, dançarina imbatível da “Dança do Pudim Danone” e que não se importava com as figuras que podia estar a fazer, desde que se estivesse a divertir. Quem não se lembra da Suse? Criando um misto de timidez com uma alegria contraída, esta jovem caloira foi-se soltando à medida que atingíamos mais etapas nos dias…sempre disposta a participar nos jogos e/ou brincadeiras que nos eram apresentadas, mostrou ser uma pessoa a quem era fácil aceder, que era divertida, inteligente, simpática, bem-disposta, brincalhona e que nunca ia contra a educação que tinha recebido. Quem não se lembra…?

Por isso, considero um exagero os elogios que me são feitos. Se fui um pouco do que dizem que fui, isso não passou de um mero reflexo de um grupo estupendo que me rodeava. Se alguma vez tive piada, deveu-se ao facto de todos entrarem nas brincadeiras. Se deu muitos primeiros passos, então agradeçam ao conjunto de pessoas que me seguiram, porque foram elas que os reconstituíram e levaram as brincadeiras que nos eram propostas a um nível superior. Se há alguém que deve dar os parabéns, esse sou eu, que tenho de vos congratular pela presença diária, pela energia que incutiram nos dias e por saberem ser sempre fiéis a si mesmos, em todos os passos que deram.


VOCÊS SÃO OS MAIORES!!

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